segunda-feira, 14 de junho de 2010

Consumo, logo existo




Consumo, logo existo. Pode até parecer um exagero esta afirmação, mas mesmo quem não possui renda precisa consumir. O indigente ou o pedinte consomem, mesmo não possuindo renda. O prato de comida, a noite no albergue ou qualquer outro donativo, somente foi possível porque houve produção e alguém resolveu contribuir com os menos favorecidos e transferiu parte de sua renda para esse fim. Afinal de contas, não existe almoço de graça.

O consumo representa uma satisfação, pois é a realização de uma necessidade. Estas necessidades são, cada vez mais, oriundas da evolução da civilização e passam a integrar o rol das necessidades de quem vive nesta civilização. São necessidades como automóveis, celulares, aulas de línguas e mais uma infinidade de outras que surgiram e surgirão criando assim novas expectativas de consumo para as pessoas desta civilização. A sociedade capitalista associa o consumo à superioridade, ou seja, quanto maior o poder de consumo maior a superioridade da pessoa ou, melhor ainda, o status desta pessoa na sociedade.
Como então não frustrar as vontades, as necessidades de milhões de consumidores em potencial, ávidos por participarem desta civilização demonstrando o seu poder de consumo e, portanto o seu status, a sua superioridade? Para resolver este dilema e possibilitar que o sistema capitalista sobreviva com a produção em massa, a intermediação financeira ocupou este papel. Os bancos captam recursos de quem deseja "guardar" as sobras de seu orçamento e "intermedia", ou seja, faz chegar a quem deseja satisfazer sua necessidade de consumo imediatamente.

O custo de se consumir antes de se ter recursos para isso são os juros pagos aos poupadores e, é claro, a parte dos bancos: o chamado spread. Esta vontade ou mesmo esta necessidade de consumir imediatamente faz com que seja tão difícil para as pessoas, mesmo as mais disciplinadas, conseguir poupar. Abdicar de um consumo imediato representa um dos maiores entraves à formação de fundos para aposentadoria no Brasil e em outros países como os Estados Unidos. Mas mesmo que o plano não seja tão ambicioso como um fundo para aposentadoria (que envolve dezenas de anos), seja talvez comprar uma nova geladeira ou um aparelho de DVD, a dificuldade de se poupar por alguns meses é muito penosa. Quando poupamos, recebemos os juros que pagaríamos comprando algo financiado (em menor escala, é claro) e na compra da geladeira à vista, podemos ainda pleitear um desconto pela nossa paciência em controlar nosso impulso para o consumo imediato.

A oportunidade de consumirmos comprando à vista aparece agora com o 13º salário. Novamente o impulso consumista vem e nos sugere que devemos comprar à prazo e utilizarmos o 13º para as compras extras de natal, ou ainda mais grave fazemos as compras de natal para somente "começar" a pagar com o 13º. O resultado é que ficaremos endividados por boa parte do ano seguinte e já em janeiro vem o IPVA, as matrículas nas escolas, o material escolar, anuidade dos conselhos profissionais e é claro aquela prestaçãozinha que veio junto com as compras de natal. O que parece mesmo, em janeiro, é que estamos com uma tremenda ressaca consumista que infelizmente nos conduz ao outro "amigo" de encontro: o cheque especial.
A questão não é abandonar o consumo ou abdicar dos confortos da sociedade atual, mas controlar impulsos. A grande lucratividade dos bancos está centrada na transferência de renda. Esta renda tem basicamente duas fontes: do governo endividado e do consumo das pessoas. Realmente os bancos cobram juros absurdos e têm lucros enormes, que por sinal, fazemos questão de aumentar. Quando antecipamos o consumo, antes de termos gerado renda para este consumo, estamos abrindo mão do suor do nosso trabalho para o mercado financeiro.

O argumento da poupança parece simples, mas é preciso muito mais estudo do comportamento humano para convencer as pessoas a adiar o consumo do que imaginamos. Afinal de contas, como já foi dito: consumir é existir.

Fonte : OLIVEIRA, Paulo André de. Consumo, logo existo. Disponível em: .

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